Acolher o outro: Eis o propósito da Semana Santa
27/03/2024 - 16:32É nos gestos de humildade, de servidão e de perdão que descobrimos a verdadeira essência do amor fraterno.
Por Benedito Amônico
Na minha adolescência oeirense, não atinava para o que era patrimônio arquitetônico. Achava que o Sobrado dos Ferraz, que abrigava o Círculo Operário, era apenas o “quartel-general” do grande orador sacro Padre Balduíno Barbosa de Deus. Ali, o padre, que exercia o cargo de Orientador Apostólico, era ouvido praticamente em toda a cidade através do serviço de alto-falante. Anos depois, funcionou em sala do térreo do sobrado, o consultório odontológico de um contraparente meu, conhecido simplesmente por Pinto. Dentista prático, este, sim, foi um guardião daquele patrimônio, isoladamente. Não contava com o apoio de ninguém. Não cometeria nenhuma asneira se afirmasse que o velho prédio só não veio abaixo pela vigilância de Pinto, sempre duro na pregação pela sua restauração, que acabou ocorrendo, ainda bem! Pinto não amolecia, ou melhor, não esmorecia na sua luta preservacionista, que, no fundo, tinha a ver com o seu gabinete odontológico.
Mas, voltando aos tempos do Círculo Operário, vale lembrar as tertúlias das domingueiras promovidas pela dita Ala Jovem Circulista, que tinha à frente dois membros da entidade, de espírito jovem, embora já não fossem, Raimundo Dodô e José Epifânio. Ali já se dançava de corpo e rosto colados, que deixava a moçada em "ponto-de-bala". A Ala Jovem, com seus bailinhos, fazia um sucesso enorme! Havia ainda as famosas excursões, sobretudo para o nosso litoral, e até para vizinho Estado do Ceará. Ônibus fretado à empresa Líder, lá iam todos, na maior algazarra, para os banhos de mar.
Numa dessas excursões, comandadas pelos dois circulistas atrás citados, ocorreu um fato que deixou todos consternados. E não foi por falta de aviso, de que o mar era traiçoeiro, as ondas batiam forte na areia, em suma que era perigoso afastar-se muito da praia. Pior é que ocorreu com um deles, o José Epifânio.
Água pela cintura conversavam animadamente quanto este após piada contada pelo outro, solta gargalhada daquelas de escancarar a boca. Na hora, por uma “fatalidade dessas que descem do além”, uma forte onda bate de frente e retira da boca de Epifânio a dentadura, obra do velho Pinto, levando-a mar adentro. Foi um deus-nos-acuda! Mais que depressa Dodô mergulha na vã tentativa de pegar o “teclado novo” do amigo, sem conseguir seu intento. Voltando à praia, resolve então consolar seu desesparado amigo-banguela com palavras que, por mais que o tempo passe, não consigo esquecê-las: “não se preocupe não cumpadre; Vamos ficar de butuca ligada, pois tudo que não presta o mar joga pra fora”.