
A vida sem facebook

(*) Ferrer Freitas
Li, em número recente da revista VEJA, na seção Panorama, reportagem-entrevista com alguém de nome Felipe Teobaldo, fissurado na Internet, mais precisamente em Facebook, cujo melhor significado encontrado no google poderia ser qualquer um destes: “face do livro”, “sua história”, “o livro de sua vida”. O objeto da matéria foi o fato do entrevistado ter criado o site 100Face, reunindo pessoas dispostas a passar 100 dias longe da rede social, o que vem representando para ele um inferno. Indagado por que tomou a medida, informou: “a gente passa o dia todo on-line e nem percebe que pode estar viciado. Parecem (as pessoas) com grupos de recuperação, de gente que está sem usar droga, em total abstinência.” Perguntado se se considerava um viciado em Facebook, disse: “Claro. Eu acordava e já ligava o computador. Era a mesma coisa quando chegava ao trabalho. Uma vez, conversei pelo Face com um amigo que estava ao meu lado no sofá.” Sobre o que acharam os amigos dele ter se desconectado, respondeu: “Muitos não curtiram. Alguns dizem que eu sumi. Mas eu continuo no mesmo lugar, só não estou no Facebook. Às vezes, parece que eu não existo mais.” Finalmente disse que sua vida melhorou sem o Face: “leio mais livros e notícias que antes. Quando vou a um show, aproveito mais, porque não me preocupo em ficar contando que estou lá.”
O assunto fez-me lembrar o grande escritor José Cândido de Carvalho, de Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, que conta, em uma das histórias pitorescas da obra “Porque Lulu Bergantim não atravessou o Rubicon”, o conselho dado a um respeitador juramentado de donzelas, de nome Jeremias, que, em período de férias com algumas em Queimados (litoral do estado do Rio) não soltava um “pingo de sem-vergonhice”. Em visita para ver como iam as coisas, disse-lhe seu velho, o Comendador Noronha e Sande, provedor-mor da Santa Casa de Misericórdia e sócio remido da Beneficência Portuguesa, ao sentir a insatisfação das garotas: “Seu Jeremias, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Uma mão boba num escuro de corredor não desabona ninguém. (...) Tanto que vou mandar você de volta pra casa e ficar em seu lugar.”
E é justo pelo “nem tanto ao mar, nem tanto à terra” a invocação de José Cândido, tentando aqui definir essa coisa admirável chamada Internet que, para mim, tem dois lados. O positivo, quando coloca o mundo ao seu dispor com informações precisas ,sobretudo pra quem escreve. Em tudo facilita a consulta ao google para tirar qualquer dúvida ao redigir-se um texto. As coisas fluem com mais precisão. Já o lado negativo é precisamente o que diz o entrevistado de VEJA, seu uso desmedido, que leva pessoas a nada mais fazerem na vida a não ser ficarem na rede social. E nem vou falar nos canos aplicados em incautos que sonham com negócios fáceis. Que me desculpem meus amiguinhos de fé, irmãos, camaradas. Não quero, em hipótese alguma, desmerecê-los com este texto. Sou dos que acham que a melhor coisa na vida é ter amigos. E eu os tenho em abundância!
(*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras