
Crônica de Ônibus

*Por Carlos Washington
Hoje, levei minha esposa para colocação de iniciar o exame. Após a colocação do equipamento, saímos do espaço saúde e ela demonstrou que pretendia visitar uma amiga e, inclusive, iria com a mesma para uma consulta médica. Ficamos, inicialmente, naquele impasse de quem ficaria com o carro. Eu decidi que melhor seria ficar com ela. Eu voltaria pra casa de ônibus. Ela estranhou, pois já se prontificara a voltar de Uber, assim como sugeriu que eu, também, poderia utilizar o aplicativo.
O sol das 15 horas ardia, e não foi difícil perceber no momento em que desci do carro e enfrentei uma temperatura de 38ºC, mas com sensação térmica de 50ºC.
Confesso que, há muito, não me aventurava andar em ônibus coletivo (urbano). Mas, como “novo morador” de Teresina, embora tenha nascido aqui, por muitos anos residi fora, e precisava conhecer o sistema de transporte público da capital piauiense. Muitas vezes, passei por paradas dos coletivos e não conseguia dimensionar a “romaria” que o usuário percorre em seus deslocamentos.
Ao me aproximar do "ponto de ônibus", vi três jovens que aparentavam ser estudantes. Talvez da faculdade existente ali nas proximidades. Elas se esquivavam do astro-rei, escondidas atrás de um muro, na lateral da parada. Indaguei-lhes se naquele ponto parava ônibus com destino ao Terminal Zoobotânico. Elas se entreolharam, sorriram e, como se achasse aquela pergunta absurda, idiota, responderam que não!
Sem querer causar constrangimento, perguntei-lhes como saberiam que o ônibus que estaria próximo, se do local onde fugiam do sol não lhes era permitido visualizar a avenida, ficaram, ainda mais, atônitas! Não responderam dessa vez!
Logo, aproximou-se um "coletivo" e uma delas identificou: "Santa Lia". Pensei: vai para o Terminal Santa Lia. Uma delas completou: vai passar pelo Morada do Sol (bairro), e não iria passar no Terminal Zoobotânico. Decidi embarcar nesse ônibus mesmo assim. Paguei o valor de R$ 3,85 (três reais e oitenta e cinco centavos) com nota de pequeno valor para facilitar o troco. Aliás, não dispunha de tanto dinheiro para escolher cédula.
Depois da primeira parada, a meu pedido, o cobrador informou que eu deveria descer na próxima, ou seja, andaria, apenas, o percurso de dois pontos de ônibus. Mas, com a "lua" (sol) daquele jeito, eu estava no lucro.
Desci, depois de tentar usar uma escadaria e ser advertido pelo funcionário que deveria utilizar a porta traseira. Não entendi, naquele momento, o motivo de não poder descer pela porta do meio. Desembarquei e percorri um pequeno trecho (mas que parecia não terminar mais, tamanho calor) até a Estação Dom Severino, onde embarcaria com destino ao Zoobotânico (Terminal) e, depois, reembarcar em outro (Sistema Inthegra) até a parada mais próxima de minha residência, no bairro Morros.
Ao chegar à estação, percebi que o sistema de ar condicionado estava ligado, mas não era suficiente para reduzir a temperatura elevada, pois a entrada para o ambiente não dispunha de porta, o que permitia a entrada de vapor (calor). Consultei ao expert suburbano (criei agora: passageiro frequente) qual ônibus deveria "tomar". Ele respondeu que qualquer um iria para o terminal do meu destino. Para sorte minha, uma senhora o corrigiu informando-nos que ali, também, "aportava" ônibus que desviava o seu curso em direção ao bairro Piçarreira e que não chegaria até o Terminal Zoobotânico.
Não demorou muito, e a "marinete" (ônibus que ficou famoso em uma novela) encostou-se à plataforma (parada de ônibus com adaptação). Adentrei e esperava que o “ar condicionado” me receberia de braços abertos. Ledo engano! Ali, a temperatura não diferenciava do clima lá de fora! Paguei nova passagem: mais R$ 3,85.
Passei a observar o cansaço das pessoas. Algumas arriscavam um cochilo para "diminuir o percurso". Outras viam o tempo passar manuseando os seus aparelhos celulares.
De dentro do veículo olhava para as paisagens, por vezes não nos é possível quando estamos ao volante. Olhei para o relógio e constatei que o "Corredor" exclusivo para ônibus facilita o deslocamento, pois não encontra entraves, com exceção dos semáforos, que, diga-se de passagem, são muitos na Avenida Presidente Kennedy! Mas, entendo necessários. Foi possível observar que a nova avenida que está sendo construída já começa a mostrar a parte do asfalto e, logo mais, teremos um novo trecho para desafogar o trânsito da Zona Leste.
O percurso da Estação Dom Severino até o Terminal Zoobotânico não foi demorado: menos de 10 minutos. Mas pude, novamente, certificar-me do que já percebera dirigindo o meu carro: algumas placas indicativas das estações estão colocadas em locais invertidos, ou seja, quem se desloca em direção ao Balão do São Cristóvão não consegue identificar a estação que deverá desembarcar; o mesmo acontece com quem faz o percurso inverso.
Ao descer, fui logo indagando em qual ônibus deveria reembarcar em direção ao meu destino e, uma senhora, muito tagarela, orientou-me e disse que seria o mesmo veículo que ela iria para a sua região. Antes de subir, ouvi-a dizendo que a saída aconteceria em 10 minutos, ou seja, às 15h40min. Não esperei, adentrei imediatamente, pois estava ansioso para desfrutar do clima agradável que, por certo, encontraria no interior da "marinete".
Não demorou em eu notar que muitas "passageiras" se utilizavam se pequenas toalhas (de rosto) para enxugar o suor que corria de seus rostos e impregnava a maquiagem (já desfeita àquela hora do dia). Outros passageiros carregavam garrafas com água e buscavam se refrescar ou se hidratar. Uma das mulheres carregava uma criança no colo (seu filho) e outro filho estava sentado ao seu lado. Este pedia água a todo instante e ela sentenciou: "Você já bebeu duas garrafas de água! Agora, vai ficar com sede!". Fiquei solidário ao garoto! Um calor daqueles, e não ter o direito de ingerir um gole de água.
Chegada a hora da partida, o motorista com aparência de que já estava encerrando o seu turno, pois demonstrava cansaço, e logo demonstrou isso, quando saiu do terminal e adentrou na avenida já imprimindo velocidade, ansioso por chegar ao ponto final!
Daquele terminal até à parada onde eu deveria descer, passamos, apenas, por um ponto de ônibus, mas não houve sinalização de qualquer usuário. Quando me preparei para sinalizar, vi que alguém já o fizera, pois a luz indicativa estava acesa. Em poucos minutos chegamos ao ponto de parada, uma senhora desceu na minha frente e eu em seguida. Era o posto de combustível, onde costumo abastecer, e já sabia que "conveniência" vendia uma cervejinha. Dirigi-me ao freezer, olhei para a etiqueta de preço: R$ 6,99. Não quis saber! Retirei uma "verdinha", assoviei para o frentista, abri-a e saboreei um gole! Ah! Refrescante! Paguei. Saí caminhando para o condomínio com a garrafinha na mão e sorvendo aquele líquido saboroso. Mas, fazendo as contas, concluí que o valor gasto correspondia ao preço que gastaria com aplicativo. Não me arrependi, pois testemunhei o sofrimento de algumas pessoas e, refletindo, perguntei-me como poderia colaborar com a solução de eventuais problemas neste sistema de trânsito que já deveria ter alternativas para minimizar os transtornos do dia-a-dia do cidadão teresinense e outros que aqui chegam, diariamente.
Antes de adentrar no edifício, encontrei três senhoras (por respeito, pois não aparentavam tantos anos de vida) e que conversavam caminhando em direção à rodovia (estrada de União), certamente, com destino as suas residências. Não resisti e as censurei: – É nesta hora que vocês falam mal dos patrões! Elas sorriram com ar de negação (condenação) e seguiram viagem. Eu finalizei a minha miniaventura e sem hesitar, alheio a qualquer pretensão literária, decidi passar a simples experiência para o papel. "Eh! Vida de gado...!" (Zé Ramalho).
*Carlos Washington – Aposentado.