
Fidalgo do sertão

(*) Por Ferrer Freitas
Com este título o oeirense Luciano Nunes Santos, conselheiro do TCE, reuniu em livro crônicas publicadas no Diário do Povo ao longo do tempo, lançado em noite memorável no Metropolitan Hotel, com apresentação do jornalista e editor-chefe Zózimo Tavares. Ainda bem que cheguei relativamente cedo ao local, que dispõe de amplo estacionamento, e não tive que rodar a esmo à procura de onde pôr o veículo. De repente, começa a adentrar o espaço, um salão enorme, gente que não acabava mais. Era tanta que um amigo nosso, meu e do autor, deixou escapar: “nunca vi na minha vida tanta gente no lançamento de um livro!” O certo é que nosso Lulu, como muitos conterrâneos tratam o autor, conseguiu reunir políticos de todos os matizes e credos, sem falar em número considerável de oeirenses radicados em Teresina, formando rodas em que o papo girava em torno da velha terra das margens do Mocha, como o inesquecível Possi (Possidônio Queiroz) gostava de se referir a Oeiras.
O título do livro, “Fidalgo do Sertão”, é o da crônica em que homenageia seu padrinho, o coronel da guarda nacional Luiz Rodrigues de Souza Martins, avô paterno do governador Wilson, presente ao lançamento. Apresso-me em dizer que o texto foi escrito bem antes de Sua Excelência chegar ao cargo e trata de visita, o autor ainda muito garoto, ao coronel em sua fazenda de nome Canavieira, acompanhando seu pai, também Luiz, de sobrenome Clementino Santos, oportunidade em que foi aquinhoado com uma “cabralina” (nota de mil cruzeiros ou 1 conto de reis) para a compra de uma garrota. Pergunto: que menino esqueceria uma visita dessas?
Ainda obre o coronel Luiz Rodrigues, lembro que era um homem alto e magro de fartos bigodes de pontas viradas para cima. Todas as vezes que vinha a Oeiras não deixava de visitar o major Raimundo Bonifácio de Moura Nunes, também da guarda nacional, amplamente conhecido por Doca, cuja casa ficava no mesmo correio da minha, após duas outras geminadas. Descia pela mesma calçada, de terno de brim branco e chapéu à cabeça, merecendo ser ressaltado que o major era o pai de dona Jandira, mãe do governador, e o coronel, de seu Joaquim.
Fala ainda o autor de coleguinhas de brincadeiras no antigo Largo da Matriz, a Praça das Vitórias, local predileto para soltar pipa, ou papagaio, como queiram, e jogar bola-de-gude, alguns presentes ao lançamento, como é o caso do mais danado de todos, Raimundo de Batatinha, apelidado de Corró. Outro terrível era o delegado Evangelista (Luís) embora dona Josefa, sua mãe, não lhe alisasse os couros.
Finalmente, vale dizer que as crônicas do conselheiro Luciano são livres, leves e agradáveis de ler. Tratam, em sua maioria, de vivos e falecidos da primeira capital, além de coisas, ou “causos”, como gostam mineiros e paulistas, que só acontecem (ou aconteceram) lá. É como diz o poeta Elmar Carvalho em versos magistrais de seu Noturno sobre a cidade: “Oeiras navega num tempo sem medida,/Fugitivo de ampulhetas e relógios.”
(*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras