
'João Sem-Medo'

(*)Por Ferrer Freitas
Nos meus tempos de Rio, anos sessenta , tive a oportunidade de ver de perto alguns jornalistas esportivos que marcaram minha infância e adolescência em Oeiras como ouvinte assíduo de emissoras de rádio que transmitiam jogos do Maracanã, São Januário, Bariri, Moça Bonita, General Severiano e estádios outros. Também pela leitura de textos inseridos em revistas como a "Manchete Esportiva", da Bloch Editores, para citar somente esta. Dos comentaristas, o que mais gostava de ouvir era João Saldanha (João Alves Jobim Saldanha), gaúcho de Alegrete que viera muito moço morar na "Cidade Maravilhosa" e se projetara na imprensa carioca, sobretudo a esportiva. Neste mês de julho corrente, precisamente dia 4, completaria 100 anos de vida.
Nunca esqueço dele, de boa estatura e muito magro, em roda de papo e chope no "Petúnia", restaurante situado na rua do Catete, final da Machado de Assis, onde eu residia no prédio de número 71, Edifício Conceição, na companhia dos conterrâneos Bena (Benedito de Carvalho Nunes), Lulu, Lula (Luís Ronaldo de Carvalho Sá) e Tõin de Aderson (Antônio Amorim de Sousa). Os dois primeiros já falecidos, lamentavelmente.
Nas vezes em que vi Saldanha no restaurante citado, ele estava sempre em companhia de craques do passado, como Biguá (Moacir Cordeiro) lateral do Flamengo, Pedro Amorim, ponta direita do Fluminense, que, ao pendurar as chuteiras, como era comum dizer-se de craques que encerravam a carreira de jogador, concluiu o curso de medicina, e Simões que também jogara no tricolor. Ali o chope rolava solto. Certa vez também pintou por lá o técnico Mário Travaglini, de calva acentuada, campeão brasileiro pelo meu Vasco da Gama em 1974.
Mas, o que marcava sobremodo o grande comentarista objeto desta crônica, era seu destemor de tipos ordinários e até mesmo de “autoridades” tidas como honestas. Fora durante algum tempo comunista de carteirinha, chegando a compor a chapa do deputado Marcelo Cerqueira, importante político carioca, como candidato a vice-prefeito do Rio, não logrando, lamentavelmente, a vitória. Voltando ao futebol, vale ainda ressaltar que antes de técnico da seleção brasileira Saldanha foi, em 1957, do Botafogo , quando conquistou o campeonato carioca. Era um timaço que tinha em seu elenco Garrincha, Didi e Nilton Santos. Precisa dizer mais!? Merece registrar, finalmente, que "João sem-medo", título desta crônica, saiu da cabeça do dramaturgo Nelson Rodrigues, torcedor de carteirinha do Fluminense. Eram grandes amigos, embora Nelson fosse anticomunista ferrenho.
(*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras