NOTA DE REPÚDIO - Radar Piauí repudia ataques durante programa de rádio em Oeiras
26/11/2025 - 20:05Portal reage a agressões e cobra respeito no exercício do jornalismo
* POR LAMECK VALENTIM
Oeiras é uma cidade antiga, moldada por séculos de práticas que se repetem com naturalidade. As tradições atravessam famílias inteiras e dão ritmo aos dias, criando um ambiente onde gestos de fé ocupam lugar importante. Dentro desse cenário, existe uma característica humana que permanece silenciosa, embora bem presente: muita gente dedica mais energia ao que acontece na vida dos outros do que à construção da própria. É como se parte da população vivesse dentro de uma caverna simbólica, observando apenas reflexos e dando a eles o valor de realidade completa. Esse hábito se alimenta de frustrações acumuladas, de expectativas não realizadas e de uma dificuldade antiga de olhar para o próprio interior.
No Mito da Caverna, Platão descreve seres humanos acostumados a interpretar sombras como se fossem verdades. Em Oeiras, essa imagem encontra terreno fértil nas conversas que giram em torno de pequenos fragmentos da vida alheia, transformados em histórias inteiras pela imaginação. Para muitos, o que chega pelas frestas da curiosidade já basta para formar certezas. A filosofia explicava que esse comportamento não é novo: ensinava que o ser humano tende a se apegar às aparências porque elas parecem oferecer um tipo de segurança imediata, enquanto o conhecimento real exige esforço, coragem e disposição para enfrentar aquilo que incomoda. A luz, nesse sentido, representa clareza e consciência, algo que só se alcança quando se abandona o conforto das interpretações fáceis.
A cidade segue com suas procissões, suas velas acesas e seus rituais que marcam o tempo. No meio desse cenário tão vivo, há pessoas que preferem a superfície das sombras porque ali tudo parece simples. A vida observada no outro funciona como distração, como ponto de apoio para quem não deseja mergulhar na própria história. O interior de cada um permanece intocado, como se o autoconhecimento fosse um território perigoso. A filosofia ensinava que esse medo nasce da resistência natural ao confronto consigo mesmo, pois olhar para dentro exige reconhecer escolhas, limites, desejos e responsabilidades que nenhuma sombra é capaz de esconder.
Existem moradores que caminham por Oeiras com outra disposição. São pessoas que descobriram que a luz da reflexão nunca chega de forma suave, mas sempre chega com alguma clareza. Elas constroem seus dias com base no que vivenciam, no que aprendem, no que enfrentam, no que desejam de verdade. A filosofia dizia que a liberdade começa no momento em que o indivíduo decide observar a si mesmo com honestidade, sem depender da imagem refletida nos outros para dar sentido à própria vida. Essa decisão costuma ser silenciosa, e mesmo assim tem força suficiente para deslocar alguém da caverna para um espaço mais amplo e mais autêntico.
Oeiras continua sendo a cidade antiga que guarda memórias profundas e histórias que se acumulam em cada rua. As pessoas vivem de modos diferentes dentro desse mesmo território. Algumas permanecem diante das sombras que produzem, criando interpretações rápidas e mantendo a vida suspensa em projeções. Outras encontram um caminho iluminado pela lucidez, ainda que essa luz traga desconfortos. A filosofia ensina que a verdadeira liberdade nasce quando alguém aceita olhar para si com coragem. A cidade mostra que essa escolha continua rara, mas sempre possível.
* Lameck Valentim é professor e Jornalista