
Opinião: Água do Mocha

Por Gutemberg Rocha, do Instituto Histórico de Oeiras
É pau, é pedra, é lama, é lixo, é poluição... É o que se vê no leito do Riacho Mocha, às margens do qual Domingos Afonso Mafrense fincou estacas, dando início ao surgimento de Oeiras, berço fadado do nosso Piauí. Água que é bom, só um tímido filete sujo e sem vida. Onde está a corrente cristalina de que falava o poeta? Cadê o Poço dos Cavalos da minha infância? Será que ainda existe alguma possibilidade de se salvar esse marco da civilização piauiense?
Pela sua importância histórica e geográfica, o Mocha deveria ser preservado como patrimônio não apenas de Oeiras, mas do Piauí. Patrimônio natural que merece e precisa do empenho de autoridades, historiadores, ambientalistas e cidadãos em geral no sentido de recuperá-lo, se não na totalidade da exuberância original, pelo menos na lúdica perenidade da sua presença na história do lugar.
Mas não me iludo: a realidade nua e crua é que o Mocha teve a morte decretada faz muito tempo, e as chances de recuperação são cada vez menores. Por outro lado, ainda alimento o sonho de ver suspensa essa sentença de morte, ou que, também neste caso, exista vida após a morte, e que o Mocha, como a mitológica Fênix, possa renascer das cinzas.
E se acredito é porque sei que não estou sonhando sozinho: algumas vozes se somam às vozes que desde a década de 1970 já clamavam por socorro para o riacho moribundo, a exemplo de Aécio Nordman e Possidônio Queiroz. Hoje outras vozes se levantam, e se unem, e partem da palavra para a ação, formando associação, fazendo manifestos e manifestações, tentando sensibilizar e conscientizar as autoridades e a população. Refiro-me especialmente à AMO (Associação Ambiental de Oeiras), fundada pelo professor Emanuel Vital, o escritor Rogério Newton e vários outros ambientalistas oeirenses.
Com o perdão do trocadilho, eu diria que muita água ainda há de passar por baixo da ponte até que algo de concreto aconteça. Não sei se a minha geração testemunhará o ressurgir do lendário riacho, mas se meus netos puderem, quem sabe, até tomar banho na água do Mocha, terá então valido a pena toda a luta em sua defesa.
Neste 22 de março, Dia Mundial da Água, registro aqui a minha preocupação com o futuro do Mocha e, por extensão, com o futuro do planeta, visto que pelo mundo inteiro são flagrantes os casos de desrespeito a esse líquido tão precioso, tão valioso para a humanidade.
Água é vida. Viva a vida! Sobreviva o Mocha!