
Opinião: Razões e desrazões sobre o corte de nove árvores

Por Rogério Newton
Notícia e documentos publicados no portal Integração, dia 23/09/14, sugerem a versão oficial da Prefeitura de Oeiras a respeito do corte de nove árvores na Praça de Eventos. Usando o direito de manifestação do pensamento, sem deixar de respeitar as opiniões contrárias, passo a opinar sobre o assunto.
1. O ponto de partida de minha exposição é o de entender árvores como seres vivos. Não só os humanos, as árvores, como as outras espécies em geral, merecem viver, pelo valor intrínseco que possuem. As árvores abatidas estavam vivas, retiravam nutrientes do solo, respiravam, faziam sombra, compunham a paisagem... Havia pessoas que gostavam delas. Os argumentos apresentados como justificadores do corte, como por exemplo, as árvores eram velhas e possuíam parasitas e espinhos, são primários. A alegação de plantio de ipês rosas também não justifica o sacrifício das árvores, pois os ipês poderiam e ainda podem ser plantados em muitos outros lugares da cidade que precisam de arborização. O plantio de árvores não deve significar a morte de outras.
2. Aparentemente, os defensores da morte das árvores louvam-se em Ofício do IPHAN, datado de 14/01/14, como se este houvesse autorizado o corte das árvores. Entretanto, em nenhum momento, o documento daquela respeitável instituição autoriza o corte, nem poderia fazê-lo, pois não tem competência legal para isso. É um erro de análise e não faz sentido apoiar-se no expediente do IPHAN, pois este afirma que não vê “óbice ao plantio de 6 (seis) ipês rosas”. Essa afirmação está sendo interpretada erroneamente como sinal verde para sacrifício das nove árvores.
3. A emissão de licença ambiental é atribuição dos órgãos ambientais competentes. É incongruente a Prefeitura expedir licença ambiental para si mesma, como fez. Salvo melhor juízo, como se trata de área objeto de tombamento federal, a Prefeitura não poderia emitir a licença ambiental. A autorização para o corte das árvores deveria ser solicitada ao órgão ambiental federal. Por seu turno, o simples fato de ter havido encaminhamento de Ofício ao Ministério Público também não legitima a morte das árvores.
4. Embora os documentos publicados não justifiquem o sacrifício das nove árvores, constitui um desvio da questão essencial fixar-se neles. O cerne da questão é que árvores significam vida e são muito importantes para cidades de temperaturas elevadas como Oeiras, de escassa arborização na área urbana.
5. Embora seja um fato importante, o corte das nove árvores não é o problema ambiental nº 1 de Oeiras, que está perdendo porções significativas de suas áreas verdes urbanas, em decorrência da expansão desordenada e da existência de loteamentos que desrespeitam a Lei de Parcelamento do Solo Urbano. Um dos itens mais desobedecidos é a reserva legal de áreas verdes e comunitárias. Seja como for, o episódio serve de alerta para a necessidade de uma política pública de meio ambiente para o município, da qual, certamente, deveria fazer parte um Plano de Arborização Urbana, que a cidade nunca teve em sua longa história.
6. O episódio revela também como é difícil haver diálogo entre governantes e governados sobre assuntos de interesse coletivo. Os primeiros tem enorme dificuldade em aceitar opiniões divergentes, mesmo que sejam sensatas, fundamentadas e sinceras. Os segundos, salvo honrosas exceções, agem mais sob calor da emoção do que da reflexão e da ponderação. Ainda é escassa a presença de homens públicos e privados nos raros eventos em que se discute meio ambiente em Oeiras. Porém, a responsabilidade pela falta de norte em matéria ambiental é dupla, tanto do governo como da sociedade. Essa responsabilidade é maior entre aqueles que tem mais poder e esclarecimento.
7. Outro aspecto relevante é a escassa circulação de informações sobre temas ambientais e ecológicos em Oeiras, fora da esfera escolar. Enquanto a contemporaneidade reflete sobre a complexidade do fenômeno urbano, criando, por exemplo, conceitos como “cidades inteligentes”, “cidades sustentáveis”, “cidades para as pessoas”, Oeiras passa ao largo do rico debate contemporâneo, como se não existisse tal debate e a profusão de ideias e soluções criativas, simples e baratas para os problemas que as cidades enfrentam. Por isso, pagamos um preço muito alto, entre eles, a “maldição da resposta única”, isto é, ao invés de possibilidades novas para solução de velhos problemas, optamos por vias geralmente de mão única. Daí certa rigidez e inflexibilidade, os deslizes temperamentais de parte a parte, os lugares-comuns, as interpretações rasas e reducionistas.
8. A consciência de que não vivemos no melhor dos mundos ambientais possíveis não é nova em Oeiras. Na década de 1970, por exemplo, homens inteligentes, altruístas, que amavam a cidade, como o Prof. Possidônio Queiroz e o Engenheiro Agrônomo Luiz Gonzaga Carneiro, reivindicaram um olhar mais compassivo do Poder Público e da sociedade, especialmente para o Riacho Mocha e morros que circundam Oeiras. O que eles pensaram e sugeriram ainda continua atualíssimo. Sinto-me honrado em comungar das visões e preocupações daqueles dois grandes oeirenses.
9. Como a morte das nove árvores é um fato consumado, resta-nos retirar lições do episódio. Uma delas é que, apesar de tudo, as árvores sobreviventes continuam generosas. Atiramos-lhes pedras, elas nos devolvem frutos, purificam o ar, embelezam e dão sentido à vida. Talvez possamos aprender com sua sabedoria.
10. Finalmente, quero dizer que, apesar de discordar dos autores do fato, não os tenho como inimigos. Como todo ser humano, estão sujeitos a acertos e erros e tem potencial para o Bem. Mas tenho direito de criticar e elogiar quando achar que devo fazê-lo, nunca de dourar a pílula. Mesmo porque navegamos no mesmo barco. Se furado ou não, isso é outra história, que certamente dá lugar para muitos encontros e desencontros, matéria de que, afinal, é feita a vida.