
Ditadura só de esquerda

(*) Por Ferrer Freitas
Foi profundamente lamentável e triste a falta de civilidade e educação para com a blogueira e jornalista Yoani Sánchez, cubana de 37 anos que esteve em visita ao Brasil depois de uma luta insana para fazê-lo. Licenciada em Filologia,alcançou fama internacional pelos seus textos criticando a situação social em Cuba. Em 2007 criou o blog Generación e de lá para cá vem sendo acusada por movimentos sociais ligados a partidos de esquerda, como ficou constatado agora no Brasil, como estando a serviço do imperialismo ianque, em outras palavras, CIA, mesmo sendo contrária ao embargo econômico dos Estados Unidos a Cuba.
Essas manifestações estapafúrdias me fizeram lembrar dos meus primeiros anos de Rio, início dos sessenta, quando almoçava no Calabouço, restaurante de estudantes localizado no centro, próximo ao aeroporto Santos Dumont. Bons tempos! Éramos todos de esquerda, assíduos frequentadores de bares onde se discutia tudo, inclusive nada, entre um chope e outro. Não bastasse, vibrávamos com a revolução cubana, ocorrida há pouco mais de três anos, em 1959 (ao final do novo mandato de Raul Castro, em 2018, quando pretende sair, segundo disse na posse em que esteve presente seu irmão, o comandante Fidel, muito alquebrado, diga-se, são passados 60 anos). Antes, ainda estudante em Teresina, fiz política estudantil na combativa União Piauiense de Estudantes Secundários (UPES), sob a diligente presidência do atual prefeito de Corrente, Jesualdo Cavalcanti Barros, nosso líder maior.
Desses anos de Rio é ainda a Geração Paissandu, de filmes tidos de arte, a maioria franceses e dirigidos por Godard (Jean-Luc) exibidos na sala de mesmo nome, situada na rua Senador Vergueiro, Flamengo, com bares vizinhos de mesas na calçada, sendo o mais frequentado o Oklahoma. Os filmes, considerados de vanguarda, eram de tal modo profundos que muitos se tornavam ininteligíveis. Mas ninguém tinha a coragem de dizer que não entendera nada. Pegava mal! Aí ocorre o golpe militar e o país mergulha numa ditadura cruel, culminando, em 13 de dezembro (dia de Santa Luzia) de 1968 com a edição do Ato Institucional nº 5, iniciando-se os anos de chumbo, com cassações a torto e a direito. Nunca esqueço desse dia, pois foi justo o da colação de grau em medicina do velho Bena (Benedito de Carvalho Nunes), conterrâneo que já está no andar de cima, com quem dividia o apartamento 506 do Edifício Conceição, na rua Machado de Assis, 71. A solenidade foi no Teatro Municipal e lá mesmo o ex-presidente Juscelino Kubistchek, patrono da turma,foi preso.
Mas, afinal, o que tem a ver a blogueira Yoani com essas minhas lembranças, além do que já foi dito na abertura? É pra lamentar que não tenha aparecido mais gente pra dizer aos “paus-mandados” que a vaiaram (um inclusive chegou a dar um puxão nas suas longas madeixas) que não se deve receber pessoas daquela forma , mesmo as que não comunguem com nossas ideias. Ainda bem que no Rio, conforme vi pela TV , os cariocas dispensaram-lhe um tratamento lhano e carinhoso pelas ruas, praças, praias e pontos turísticos. Além disso, tem outras coisas, lembrando Adoniran, ditadura é uma só, tanto faz de direita como de esquerda. Ou não!?
(*)Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras