
O morro da Cruz

(*) Ferrer Freitas
No primeiro dia do século XX, à frente de inúmeros fieis, o Padre José Dias de Freitas, pároco de Oeiras desde 1872, realizou caminhada ao morro que fica a oeste da cidade, lado que dá acesso à estrada que demanda a Floriano, levado em cadeirinha por paroquianos, em virtude de sua idade avançada. Ali realizou a bênção de cruz de pedra, marco simbólico do início da nova centúria. A partir do ato, a elevação, que compõe um anel com outras que circundam a cidade, passou a ser chamada de Morro da Cruz. Posteriormente, descobriu-se no valão formado com o que lhe fica à esquerda, denominado da Sociedade, uma verdadeira piscina formada com água da chuva, que recebeu o nome de Lago Azul, refrigério para os que se arriscam no banho.
Passados 100 anos, chega o da graça 2000 e a administração municipal de então resolve substituir aquela cruz de cantaria centenária, que, a bem da verdade, estava em estado lastimável, por outra bem maior e mais imponente, além de colocar à frente da escarpa, em letras enormes, o topônimo da cidade, OEIRAS, que faz lembrar, sem dúvida, a meca do cinema, HOLLYWOOD, Los Angeles (Califórnia). Paralelamente procedeu-se à urbanização do mirante natural visando transformá-lo em espaço de lazer, inclusive com barzinho, o que, parece, não vingou, pois lá estive, não faz muito tempo, e tudo estava abandonado, com banheiros destruídos e muito lixo espalhado, o que é muito triste.
Para tristeza maior ainda, constato em matéria do Portal Folha de Oeiras, ilustrada com fotos, trabalho de terraplanagem visando o loteamento da área. E me pergunto: por que tanto desprezo com Oeiras, que ostenta o título de Cidade Monumento Nacional e teve, recentemente, seu centro histórico tombado pelo IPHAN? É lamentável! O Rio de Janeiro foi recentemente elevado pela UNESCO à condição de Patrimônio Cultural da Humanidade, por conta de sua paisagem urbana, que contém a maior floresta do mundo, da Tijuca. Estende-se aquela maravilha verde das encostas do morro do Corcovado até perder-se de vista, passando pelo Alto da Boa Vista, com trilhas, cascatas e vários espécies da fauna e da flora.
Arrematando, um pouco fora do foco. Há 160 anos mudaram de Oeiras a capital, trazendo o predicamento para esta amorável Teresina, terra dos meus filhos e de inúmeros amigos, e que aprendi a amar. À época da mudança, ainda estava vivinho da silva, embora em avançado estado de senilidade, Manoel de Souza Martins, o homem que mais tempo administrou o Piauí. Na obra VAQUEIRO E VISCONDE, NÉ DE SOUZA na primeira edição, o escritor oeirense Expedito Rêgo, assim romanceou pensamentos de seu Né sobre a mudança, após papo com amigos e compadres inconformados: “...continuou fitando a brancura da parede em frente, perdido em seus pensamentos.” (...) “Saraiva, fedelho de vinte e poucos anos, vaidoso, queria fazer história, desejava ser fundador de cidades. Tinha o poder nas mãos e ele conhecia muito bem o que significava ter o poder.” Como gostaria de reaver, para o Instituto Histórico, livro de atos do Visconde, patrono da entidade, importante para consultas, impresso na Tipographia Provincial no ano de 1838. Uma cópia seria bem recebida!
(*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras e colaborador do Mural da Vila
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