
Os últimos dias de um presidente

(*) Por Ferrer Freitas
Revi, recentemente, o filme “Getúlio” , produção de 2014, dirigido pelo cineasta João Jardim, marido da atriz Carla Camurati. Retrata os últimos dias do presidente Getúlio Vargas, interpretado por Tony Ramos. O papel de sua filha Alzira, esposa do engenheiro-militar Ernani do Amaral Peixoto, posteriormente político de renome nacional, é interpretado pela atriz Drica Moraes. GG, como Getúlio era carinhosamente chamado, suicidou-se na madrugada do dia 24 de agosto de 1954 no Palácio do Catete, com um tiro no coração. Em Oeiras, a primeira pessoa a ouvir a notícia da tragédia foi o dr. Pedro Amador Martins de Sá, que foi Juiz de Direito da Comarca por muitos anos, substituído pelo dr. Raimundo Marques, pai de Fernando e Herbert. Este, amplamente tratado por Beto, veio a tornar-se um dos bons colegas de minha infância, mesmo residindo na "rua da Feira", posteriormente Praça Coronel Orlando.
Voltando ao suicídio do presidente, vale dizer que foi notíciado em edição extra do "Repórter Esso" pelo locutor Heron Domingues, logo nas primeiras horas da manhã. Em Oeiras foram suspensas as aulas nos Grupos Escolares Costa Alvarenga e Armando Burlamaqui. Aluno deste, que funcionava no antigo largo da Conceição, posteriormente Praça Mafrense, fui aluno da professora Eva das Neves Feitosa, que também exercia o cargo de diretora. A escolha foi da minha madrinha de batismo Raimunda Mendes da Silva, amplamente conhecida por Mimbom, embora nossa residência ficasse na Praça da Bandeira, bastando atravessá-la, em diagonal, por trás do coreto, para chegar ao Costa Alvarenga.
Poia bem. Quem primeiro tomou conhecimento do suicídio, como disse, foi dr. Pedro Sá. Em seguida o saudoso Eurico César Rêgo que toda manhã passava cedo pela casa do meritíssimo para o café , isso antes de rumar para o Bar Café Oeiras, cujo arrendatário era seu irmão, Sr. Assuero Rêgo. Suspensas as aulas, retornei para casa, lépido e fagueiro, interessado no noticiário pelo rádio a bateria do meu velho, João Burane, da marca Mullard. E aí pude constatar que fora uma tragédia que mexeu com o brasileiro em sua grande maioria. Tinham Getúlio como "pai dos pobres"! Vale registrar que o paraibano Jackson do Pandeiro, falecido, gravou o baião de Zé Ramalho (só agora tomei conhecimento da autoria) "Ele Disse" de versos iniciais assim: "Ele disse muito bem: 'o povo de quem fui escravo não será mais escravo de ninguém...'
Finalmente, como tudo em Oeiras, mesmo sendo lembrado de forma séria tem sempre um lado pitoresco, soube, já faz alguns anos, que um gozador já inteirado do suicídio, ao ver Antônio Bocão, que andava sempre com um bermudão e só vestia camisa aos sábados para transportar para as residências as compras da feira, disse-lhe em alto e bom som: "tu matou o homem!" A reposta não poderia deixar de ser outra: "fui eu não, moleque!"
(*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras