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Professora mestra lança livro em oeiras
Por: em 03/11/2009 - 01:37
Numa noite muito concorrida foi lançado no último sábado o livro História e Memória de Educação Oeirense, de autoria da Professora Mestra Amada de Cássia Campos.
O lançamento aconteceu no Café Oeiras, e contou com a presença de um grande número de pessoas em especial professores, ex-professores a diversas autoridades políticas.
O cerimonial foi conduzido por Amanda Campos e a apresentação do livro coube ao professor e jornalista Stefano Ferreira. A noite teve ainda recital poético com a professora Rita de Cássia Neiva e poema-performance com Lameck Valentim.
História e Memória da Educação Oeirense É um trabalho historiográfico de caráter exploratório com abordagem de natureza qualitativa. Está fundamentado teórico - metodologicamente na Nova História Cultural, nas idéias de autores como Jacques Le Goff (2003), Roger Chartier (1990), Peter Burke (1991 / 2004), Maurice Halbwachs (1990), Paul Thompson (1992), Michel de Certeau (2003), e outros, como também na produção de diversos historiadores brasileiros, piauienses e oeirenses. O livro apresenta resultados de pesquisa realizada com o objetivo de reconstituir aspectos da história e memória da educação de Oeiras e, faz uma retrospectiva histórica da cidade e de sua realidade educacional situada no limite temporal que se estende desde meados do século XVIII até a primeira metade do século XX, focando a análise no período de 1830 até 1950, que corresponde ao momento em que o ensino público na província do Piauí e particularmente em Oeiras começou a dar sinais tímidos de avanços até a fase caracterizada pela consolidação do ensino público após criação do primeiro grupo escolar.
Para encerrar a noite, o público teve o show Humor e Música com Otávio César e Carla Ramos.
Confira abaixo o texto de apresentação do livro, feito por Stefano Ferreira.
“Ninguém escapa da educação. Ela é condição necessária para a vida humana. Mas a educação é paradoxal: ao mesmo tempo que é instrumento de controle social, ela contribui para a modificação das condições existentes; ao mesmo tempo que oprime, liberta.”
Apresentar um livro é sempre uma responsabilidade muito grande, uma possibilidade de oferecer de maneira objetiva e certeira o que os leitores, diga-se de passagem, heterogêneos, vão encontrar".
O livro, “História e Memória da Educação de Oeiras”, aumentou ainda mais essa responsabilidade, visto que é uma obra de uma profundidade imensurável e com um impacto documental tanto no campo histórico, quanto pedagógico.
A obra de caráter memorialista, historiográfico e contextual, não se limita ao academicismo frio da maioria das teses, mesmo tendo sido fruto de um minucioso estudo de pesquisa da Professora Mestra Amada de Cássia Campos, apresentada como exigência no Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal do Piauí.
A autora vai às nascentes das escolas isoladas, mostra as tentativas de organização destas, chegando à instalação do liceu provincial e no estabelecimento dos educadores artífices.
Depois mergulha nas cinzas do processo educacional de oeiras, após a transferência da capital para Teresina, trazendo ao leitor momentos decisivos como o fechamento do liceu no governo de Antônio de brito Sousa Gaioso.
Assim a autora vai percorrendo todas as nuances do processo, mostrando os passos ora lentos, ora apressados da evolução educacional, com a carência dos recursos financeiros alegada pelos governantes em diferentes administrações e a falta do empenho político no que se refere á qualificação dos professores. Caminho que vem desaguar no século passado.
Não se trata de uma pesquisa meramente cronológica desprovida de uma reflexão, pois a própria amostragem das práticas políticas e educacionais praticadas, cria no leitor a necessidade de questionar como o processo educacional se estabeleceu como foi reconfigurado e como essas práticas de outrora repercutem até hoje na educação que praticamos.
Até por que, a autora traça todo esse nicho histórico, político e social de nossa educação, respaldada térico-metodologicamente na nova história cultural, olhando essa memória contagiada pelo pensamento de Jacques Le Goff, Roger Chartier, Peter Burke, Paul Thompson, dentre outros.
Por se tratar de uma pesquisa com um recorte local, a autora mergulhou também em muitos documentos e pesquisas de historiadores brasileiros e piauienses, mas é incontestável a magnitude e a importância das fontes documentais e iconográficas, oficiais e não oficiais, pesquisa aprofundada em arquivos empoeirados, que guardam a nossa memória e que agora fazem parte de um documento vivo, descortinado pela autora e pronto para que acadêmicos, pesquisadores, educadores ou não possam vislumbrar o caminho árduo, paradoxal e ao mesmo tempo reflexo de uma prática sócio-política de diferentes momentos de nossa sociedade.
A relação intrínseca da cultura com o ensino pode ser percebida claramente, quando a professora situa o leitor à praticas artísticas como a música. Vale frisar a importância dada no livro à produção intelectual dos inesquecíveis artistas Posidônio Queiroz e Benedito Amônico de Freitas, o Burane.
Além disso, a autora chama atenção para a música como complemento da educação feminina, citando o trabalho das professoras dona Araci Carvalho, mãe do notável escritor O.G. Rêgo de Carvalho, bem como das senhoras Filó Carvalho, Maria Queiroz, Liquinha Lopes, petinha Amorim, Eva Feitosa e Fransquiquinha Martins, que ensinaram com muito zelo e dedicação a arte do bandolim, banjo e violino ás moiçolas da época.
Há um universo lúdico sim na obra, algo que emociona algo que fascina algo que nos toca, quando presenciamos, o relato conciso de educadores à frente de seu tempo.
Sem querer parecer romântico, vi que alma do livro se configura nos relatos orais, relatos de vida, expostos em horas e horas de entrevistas valiosas com educadores e personas da velha urbe relacionadas com o processo educacional oeirense. Muitas delas, homens e mulheres que têm sua relação cultural com a cidade, provando que mesmo numa época onde a educação formal obedecia á uma pedagogia normativa e uma didática tradicional, o conhecimento era proporcionado pela vivência do dia-a-dia, mesmo por que num celeiro cultural de tradições, o ensino através da construção identitária de nosso povo sempre foi construído e repassado de geração a geração.
Vale a pena percorrer esse caminho de nossa educação através dos depoimentos emocionados da professora Amália do Espírito Santo Campos e da professora Maria Reis, que reconstituíram aspectos curiosos do ambiente escolar, desde a época em que foram alfabetizadas aos áureos anos em que serviram à educação no colégio Costa Alvarenga e mostram através de seus relatos as mudanças da educação particular em residências, sem nem mesmo a presença de lousas, até a educação coletiva das salas de aula que conhecemos até hoje.
Outro ponto alto do livro é a reconstituição da vivência escolar mostrada pelo senhor João da Silva Matos e pelo senhor Benedito Lopes Reis.
É importante salientar que as mudanças educacionais vão se mostrando na obra sempre aliadas ás mudanças históricas, enfileiradas à um estudo da educação a nível de Brasil. Todas essas mudanças são acompanhadas pelas ilustrações de um rico acervo iconográfico das escolas, do material escolar da época como palmatórias, boletins e fotografias dos educadores construtores de nosso processo de ensino.
O grupo escolar Costa Alvarenga possui um lugar especial na obra, sua tradição educacional e seu quadro de educadores que fizeram história em nossa terra, dá a ele um visibilidade, principalmente aos seus vinte primeiros anos de funcionamento, aonde o leitor pode passear pelo trabalho das professoras normalistas Eva Feitosa de Carvalho, Elizabeth de Carvalho e Alina Ferraz, saudosas e divisoras de águas na educação oeirense nos anos 30.
Algo em particular me chamou atenção no estudo, os materiais escolares usados em diferentes épocas. A autora chega a lembrar que um dos livros que constam na lista do Grupo Escolar Costa Alvarenga, ainda povoa a lembrança dos leitores sendo o mais citado nas entrevistas realizadas, intitulado “Coração de Crianças”, recebeu um tópico exclusivo no livro.
O livro vai costurando o passado histórico da primeira capital, tendo como linha condutora do trabalho a consciência do caráter humanitário embutido nas entrelinhas do texto, pois trata das relações sociais e culturais possibilitadas pelo processo educacional.
Assim, distancia-se da antiga periodização da educação em colonial, imperial e republicana, tendo como norte temporal fatos políticos que considerou relevantes ao nosso ensino.
O educador francês Philippe Perrenoud nos alerta que “diferenciar o ensino é fazer com que cada aprendiz vivencie tão freqüentemente quanto possível, situações fecundas de aprendizagem”. Ao final do livro lembrei-me da citação do escritor, pois foi o que o trabalho me deixou de mais intenso, cada época tem um terreno fértil para se ensinar, para se transformar, para se promover o conhecimento.
Para nós educadores, o livro é hoje o maior instrumento para uma reflexão do que somos e por que chegamos a ensinar como hoje ensinamos. Para a cidade de oeiras, o livro é um resgate documental de parte de sua história que poderia está perdida em arquivos, para a sociedade um grande alerta para que vejamos como a educação sempre foi e será a única porta para a formação de seres verdadeiramente humanos e sensíveis ao mundo que nos cerca. Pois o livro tem uma universalidade latente: a temática. Educação em oeiras nos remete ao tema educação: peça fundamental a evolução do homem em todas as épocas e regiões desse planeta chamado terra.
Muito obrigado!
Stefano Ferreira
Jornalista, Professor e Poeta
Oeiras, 31 de outubro de 2009, Dia de Nossa Senhora do Rosário.