
Uma orquestra no Céu

*Por Gutemberg Rocha
Quem se habituou a deleitar-se com a sonoridade inebriante da tradicional orquestra “Bandolins de Oeiras”, regida pela professora Celina Martins, há algum tempo já vinha sentindo falta dos acordes de algumas de suas principais componentes: Petinha Amorim e Lilásia Freitas. Por problemas de saúde, elas se afastaram das apresentações e até mesmo das missas dominicais, quando os bandolins costumam acompanhar o coral “Madrigal Nossa Senhora da Vitória”, hoje regido pelo músico e historiador Francisco Rêgo. Mas a ausência das duas não impediu que as demais – Zezé Cabeceira, Rosário Lemos e Nieta Maranhão – continuassem a maratona de missas, aniversários e outros eventos, para os quais são frequentemente convidadas a tocar.
Para tristeza geral, às vésperas do último Natal o grupo perdeu mais uma de suas estrelas, e desta vez por morte: Rosário Lemos. Nunca mais a veremos deslizando os dedos pelas cordas do seu instrumento, sempre tratado com todo zelo e carinho. Como era bom vê-la tocar! Quanto esmero, quanta satisfação, quanto amor! Espero que tudo isso tenha-se plantado no coração musical de outros oeirenses; que as sementes lançadas através dos sons inesquecíveis dos bandolins de Rosário e suas companheiras encontrem solos férteis e germinem em abundância. Algo de concreto já é possível perceber: a orquestra “Novos Bandolins de Oeiras” é, acredito eu, fruto dessa semeadura.
Rosário Lemos morava no sopé da colina do Rosário, passagem quase obrigatória para quem se dirige do centro da cidade para a igreja do Rosário. Para mim, era um enorme prazer fazer uma paradinha em sua casa, para uma breve prosa, ao sabor de um cafezinho fresquinho ou uma deliciosa cajuína. Não mais a veremos ali, mas aquela casa e aquele caminho sempre despertarão em muitos oeirenses a lembrança da sua presença marcante. Não mais a veremos aqui, neste mundo, mas tenho esperança de encontrá-la um dia, no Céu, onde sei que está muito bem acompanhada.
Se ela bem andou, a estas alturas já deve ter-se integrado à legião de conterrâneos que a antecederam, mormente as figuras de realce da musicalidade oeirense. Com seu bandolim, Rosário Lemos hoje faz parte de uma orquestra no Céu. Uma orquestra que conta com a participação de Eva Feitosa e Aracy de Carvalho, também nos bandolins, Careca e Zeca Amorim nos violões, Possidônio Queiroz na flauta, Levi no pistom, Zé da Guia na tuba, Maestro Jeremias na rebeca, José Vidal no violino, Alcione na guitarra, Clóvis Freitas na cuíca, Nilson Palha na gaita, Maria Inês no harmônio, Sebastião Carlos no sax, Antônio Diogo na clarineta, João Cassiano no bombardino, Burane no violoncelo, Seu Basto no bombo, Benedito Carmo no contrabaixo, Antônio Dentim no banjo, Yayazinha no piano, Gerson Campos no vocal, e tantos outros músicos de talento, sob a regência do maestro Bugyja. Uma orquestra pra ninguém botar defeito! Uma orquestra que haverá de receber com pompas e honras a todos os oeirenses que mais dia menos dia haverão de aportar na morada eterna. E, com uma orquestra dessas, cada recepção será, com certeza, uma festa divinal!
*Gutemberg Rocha é membro do Instituto Histórico de Oeiras