
Confraria Eciana de Oeiras

* Por Dagoberto de Carvalho Júnior
Escrevi no “Roteiro dos Passos”, do meu guia histórico e sentimental da velha-cap, que um “Passeio a Oeiras” não deve ter data. Vale sempre, qualquer que seja o tempo. Mas, se me fosse dado escolher um dia para chegar à cidade, que fosse numa Quinta-Feira da Fugida, que antecede no calendário de nossas tradições, a Sexta-Feira de Passos.
Outra boa lembrança associada as minhas viagens à terrinha, é a “cidadela sob a chuva” – o que lhe aumenta o bucolismo e, em mim, o bem querer – coincidência que se pode esperar de invernos mais generosos ou, mesmo, até das “primeiras águas” benfazejas de Nossa Senhora da Conceição, pois as visitas, “ad limina” do poeta acontecem mais entre o Festival de Cultura e a Semana Santa. Assim é que nunca me esqueço de pedir a Dona Raimunda, governanta da casa ancestral da Rua das Flores (agora, de Tia Cacá), que me “providencie chuva para a chegada”. Pois não é que na mais recente dessas “desobrigas” – haja lembranças do acólito de Leopoldo, monsenhor – mais precisamente no dia 27 de fevereiro do ano que passa (não há como deixar de datar tão boas memórias), acabou chovendo justamente na hora marcada para começar o “Jantar com o Abade da Cortegaça”, (do livro de Eça de Queiroz, “O Crime do Padre Amaro”), ato de fundação da Confraria Eciana de Oeiras. Raimunda é mesmo amiga de São Pedro. Chuva e escuridão fizeram-me até perder o conhecido endereço e chegar atrasado – também fora buscar a professora Rita Marques e sua aluna (que sabe de cor o meu “Passeio”), Marcília Sousa – ao “Bom Gosto”, que outro não era senão a esquina repaginada do velho B. Maroca; onde esperava, literalmente, à luz de velas, Yara Porto, a dedicada e competente secretária do grêmio. Seu esmero ficou na “pasta-memória” do evento e no marcador (de textos) comemorativo. A simpatia, na lembrança desta crônica.
Bem que Joca Oeiras, mesmo em tom de “blague”, escreveu no site da Fundação Nogueira Tapety, quando estive no Colégio Paulo Freire, dois meses e meio antes, falando de Eça e homenageando Cassi Neiva, que eu “se, e quando, quiser, posso fazer chover na Primeira Capital do Piauí”. Brincadeiras à parte – e coincidências bem aproveitadas –, o certo é que lá estiveram quase todos os convidados das duas professoras. As comunicações literárias foram de Cristina Araújo e do cronista. Todos se comprometeram com a causa: Francisca das Chagas Santana; Sânia Santos; Maurenize Nunes; Edson Sá, Júnior Vianna, o promotor de justiça (que eu já elevara a “procurador geral”), Carlos Rubem Campos Reis e – como “dono da casa”, ou simpático mestre de cerimônias – Emanuel Gama. As receitas do Abade tiveram o tempero oeirense de Odete.
O discurso inaugural da presidente Cassi Neiva revelou os sonhos dos presentes, de dotar a cidade de mais um grupo de estudos literários temáticos, como os que existem em Lisboa, Vila Nova de Gaia e Tormes, em Porugal; e no Recife e no Rio de Janeiro. Indo mais longe, testou a modéstia do outro homenageado da noite, dedicando-me espaço que não mereço, numa Confraria que imaginei só de Eça. Nenhum de nós imaginaria, pois diante dele, diante do autor das “audácias de linguagem, que iniciaram a reforma das milícias literárias indígenas”, até Camilo Castelo Branco – seu contemporâneo e contra-referência, dizia-se, “cabo de esquadra da tropa fandanga”. Rendi-me – “pobre homem” de Oeiras do Piauí – à bondade dos amigos.
O encontro teve alguma coisa da “encantada e quase fantástica Coimbra” de onde Antero de Quental – a outra figura cimeira da Geração de 70 – sempre conservara uma saudade romântica. Assim me conservo em relação com Oeiras. Assim me mantenho com relação a nossa Confraria. Homens e mulheres – como referidos em “Os Maias” – “Três ou quatro mulheres para cortarem com a graça e o gosto, a aspereza das filosofias”.
* Dagoberto Carvalho Jr. é da Academia Piauiense de Letras