
O fim depende do começo

(*) Ferrer Freitas
Revi agora, passados dez anos, o filme “O Clube do Imperador”, com Kevin Klyne no papel principal interpretando o professor de História de nome William Hundert do colégio St. Benedict’s, preparatório para alunos da nata da sociedade americana, com ênfase em lições de moral através do estudo de filósofos gregos e romanos. Permito-me transcrever trecho da sinopse para ser fiel ao enredo da fita: “Hundert, comprometido com seus alunos, destaca de forma enfática que ‘o caráter de um homem é o seu destino’, esforçando-se para impressioná-los sobre a importância de atitudes corretas. Repentinamente algo perturba esta rotina, a chegada de Sedgewick Bell (Emile Hirsch), o filho de um rico e influente senador. Sedgewick entra em choque com as posições de Hundert, que questiona a importância daquilo que é ensinado”.
Acreditando que poderia mudar o caráter do rapaz, que se revela inteligente e perpiscaz, transporta-o, em detrimento de outro aluno, do quarto para o terceiro lugar no exame final, de modo a permitir sua participação em concurso levado a efeito, anualmente. A exatidão nas respostas de todas as questões, como, por exemplo, qual frase foi dita pelo imperador romano Júlio César antes de atravessar o Rubicon, no caso “alea jacta est” (a sorte está lançada), permite ao primeiro colocado ser chamado Imperador, além de receber coroa de louros com a saudação “ave César!”, de toda turma. Para decepção do professor, Bell, assim chamado, não aproveita a chance, flagrado que é com as respostas presas na larga manga esquerda da toga romana, indumentária usada para dar maior justeza e realismo à disputa.
Passam-se 25 anos. O bem-nascido toma o lugar do pai à frente de inúmeras empresas e promove, em espaço de lazer de uma delas, recepção para os antigos colegas e o já então velho mestre. Consultado, este aceita reeditar o concurso, para nova decepção, já que o incorrigível aluno é flagrado novamente colando. Com diminuto aparelho no ouvido (ponto) obtém as respostas repassadas por alguém que se prestou ao serviço em troca de prato de comida e alguns trocados, como ele mesmo confessa, com desprezo, em conversa no banheiro com o professor. Só que o papo é ouvido por seu filho de 8 anos, cuja presença não fora notada por estar dentro de box com a porta cerrada. Desnecessário dizer o grande mal-estar causado quando se depara com o garoto, que não esconde sua profunda decepção.
Pois bem. No fundo, o que queria mesmo no reencontro com ex-colegas e o velho mestre era lançar sua candidatura a senador, o que faz com enorme euforia para registro de canais de TV e muitos repórteres. Sentia-se com direito adquirido, coisa comum também aqui entre nós. Resumo da ópera, a máxima acima colocada como título, tirada da sinopse da fita, é uma certeza. Alguns homens não mudam o caráter mesmo com oportunidades que se lhe apresentem ou sejam oferecidas. Pior é que repassam aos filhos os maus exemplos e, vida que segue, o povo que pague a conta, sobretudo quando os rebentos se tornam políticos.
(*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras