
OPINIÃO: A Magia da Flor de Passo: A fé que se fez arte

Por Cassí Neiva e Júnior Vianna*
São das mãos piedosas que debulham rosários, que desabrocham na heráldica cidade de Oeiras as flores de passos. Artificiosas, leves e sensíveis colorem a sacra passagem do Senhor dos Passos. Flores piedosas que usurpam do alecrim a essência silvestre, perfume doce que impregna as narinas dos romeiros que contritos e espremidos trilham a Via Crucis da urbe colonial.
Elas estão por todos os lados, nas janelas dos solares, nas mãos dos romeiros que as camuflam com suas vestes roxeadas, cor insígnia do amor piedoso... As flores de passo estão nos nichos de Filoca, Lindoca e de Cota! Estão ainda no Engano e em Naninha, populares referenciam nossa para designarmos o pertencimento de cada capela de passo, onde são abertas em dolente saudação ao Bom Jesus. Ali, naquelas ermidas uma profusão de flores, feitas previamente para enfeitar a sacra passagem. O que dizer? O que sentir? Mestre Fonseca Neto, atento, atestou: “Não é destaque que se cheire, mas é das que contem uma substância e força também essencial, que movem uma cidade inteira em sua história.” O poder da ressignificação dar ao oeirense o poder de fazer dos símbolos um elo entro o humano e o sagrado.
As flores de passos, não possui beleza exagerada, externa a singeleza do sertão, é feita com simplicidade para uma cristandade do mesmo quilate. A peça artesanal divide-se em três partes: o talo, a açucena e a rosa. E assim enchem as estações como se fosse um jardim florido. São símbolos da arte popular oeirense para embelezar cada capelinha, mas ganhou ao longo do tempo valor místico e força sobrenatural, principalmente para a massa camponesa, que acreditam que as flores caso forem queimadas e jogadas ao redor da casa, evita que haja chuva de vento. E recai sobre elas a metáfora existencial, “Tu és pó e ao pó voltarás”, reflexão pertinente para aqueles que tomam o caminho de Cristo, não aquele vergado pelo peso da cruz, mas, sobretudo, do Ressuscitado que desabrochou da morte para a vida. Na mais profunda oeirensidade, roxa de paixão, pontuou Dagoberto Júnior: “São flores únicas, não existe noutro lugar. É símbolo da festa.”. Assim, podem ser chamadas de flores de Oeiras, algo típico do artesanato local, tradição antes passada de mãe para filhos.
É indecifrável o mistério cristológico contido nas flores de passo, que impregnada de fé, inebria o universo interior do católico oeirense. Uma sincronia de oração inunda o nosso âmago quando tocamos na flor de passo, que, embora na simplicidade de sua composição de papel e de talo de buriti, provoca uma latente denotação de plenitude salvífica. Sentimos nelas, o cheiro da presença operante do Cristo Redentor, posto que as mesmas exalam um aroma indefinível de proteção, perdão, escuta e salvação. A magia de sua força homérica permanece de maneira efusiva no imaginário coletivo de centenas de fiéis da Capital da Fé.
Na nossa acepção, a flor de passo tem várias interpretações:
Para os peregrinos, é o farol de encontro contínuo com Jesus Cristo;
Para as mães, é o amuleto de amor ágape;
Para as crianças, a esperança de um mundo florido de alegria;
Para as famílias, a aliança do amor fidedigno e permanente;
Para os músicos, a melodia que embala a existência humana de bondade;
Para os literatos, a poesia que sensibiliza e transforma a alma
Flor bela, singela, encantada, inusitada; que embeleza a razão e a emoção de quem a faz, de quem a presenteia e de quem a recebe. Em cada passo oeirense por onde passa o Bom Jesus, a Flor de Passo domina o cenário paisagístico e simbolicamente vivifica Jesus. É uma fonte inesgotável de renovação e de crença na Ressurreição do Nazareno nas ações, sentimentos e pensamentos da existência humana. Nossas mãos e o nosso coração são agraciados com o toque milagroso da flor de passo que, imortal na cultura mochina, externa docilmente o Filho da Virgem Maria. E assim Oeiras caminha nos Passos do Bom Jesus, através da energia celestial que emana essa enigmática e divina Flor!
Flor canto;
Flor encanto;
Flor luz;
Flor JESUS!
*Pedagoga; Presidente da Confraria Eça-Dagobertiana; Membro do IHO e Conselheira da FNT
*Professor, membro da Confraria Eça-Dagobertiana; Membro e do Instituto Histórico de Oeiras