
Opinião: O legado de Bento XVI

Por Gutemberg Rocha
(Sócio do Instituto Histórico de Oeiras)
Ao anunciar a sua renúncia, em fevereiro do ano passado, o Papa Bento XVI surpreendeu o mundo, dando margem a muita especulação. Deus sabe o real significado de tal gesto, a meu ver de coragem e humildade, e o tempo dirá as consequências que dele advirão. Consequência imediata foi a eleição do simpático e humilde Francisco, nascido Jorge Mário Bergoglio, argentino, devoto fervoroso de Nossa Senhora.
O Papa Francisco chegou como uma suave e reconfortante brisa de fé, esperança e caridade. Desde a sua primeira aparição na sacada da Basílica de São Pedro, como Bispo de Roma, o mundo o reverenciou por sua simplicidade e espontaneidade. Logo cativou católicos e não católicos, cristãos e não cristãos, crentes e ateus. A partir da escolha do nome, sua postura foi aplaudida inclusive por brasileiros radicais na rixa com os argentinos.
Quis a Providência Divina que sua primeira missão internacional fosse ao Brasil: a Jornada Mundial da Juventude, em julho de 2013, no Rio de Janeiro. Quem compareceu ao evento – e eu estava lá! – sentiu de perto o poder cativante do novo Papa. Avesso às formalidades do cargo, Francisco aproximou-se das pessoas, distribuindo sorrisos e carinho. O povo aglomerou-se pelas ruas, calçadões e avenidas, tentando achegar-se a ele e, quem sabe, até tocar-lhe as vestes. Eram milhões de jovens, mas também adultos, idosos e crianças, e a Cidade Maravilhosa viveu dias de paz. Quem ao menos conseguiu vê-lo passar no papamóvel sentiu-se abençoado pelo seu aceno afetuoso, e, mesmo de longe, vendo-o tão somente nos telões, o fato de estar no mesmo espaço geográfico de Copacabana, Favela da Varginha, ou onde quer que estivesse o Pontífice, já significou uma graça para os peregrinos. Valeu a pena qualquer sacrifício.
Até pela tevê foi emocionante. Em cada gesto, cada palavra, cada olhar, Francisco se fez conhecer. Não apelou para declarações bombásticas ou jogadas de marketing. Com serenidade e firmeza, disse o que precisava ser dito, respondeu ao que lhe foi perguntado, não fugiu dos temas polêmicos, tampouco alimentou polêmicas ou se posicionou como juiz da humanidade. Agiu conforme suas palavras, falou conforme seus atos. Exortou a Igreja a comportar-se como a Mãe que é, aproximando-se dos seus filhos, amando-os, perdoando, orientando e evangelizando. A exemplo de São Francisco de Assis, o Papa Francisco parece ter vindo para “reconstruir” a Igreja de Jesus, reconduzindo-a aos trilhos da humildade e da opção preferencial pelos pobres.
Tudo isso é fruto da semente plantada por Bento XVI com o ato de renúncia, um ato ousado que veio enriquecer a biografia de um grande pontífice, cujo legado ainda será devidamente avaliado pela História. De já, afirmo que parte importante desse legado chama-se Francisco, “o Papa que veio do fim do mundo”. Rezemos por ele.