
Os irmãos (sa)tíricos

Carlos Rubem*
Acerca do artigo “A política em Oeiras ao longo do tempo”, publicado no jornal “Diário do Povo”, edição do dia 12 de dezembro de 2010 (domingo), por Ferrer Freitas, cronista de boa cepa, cabe acrescentar que o momento histórico vivido naquelas eleições estaduais de 1958 – marcadas pela morte dos candidatos a governador do Estado e a Senador da República pela coligação UDN-PTB, Demerval Lobão e Marcos Parente, respectivamente, e conseqüente eleição para governador vencida pelo parnaibano Chagas Rodrigues – é objeto de pesquisa de vários historiadores, entre os quais se destaca o jornalista Kenard Kruel que escreveu um livro sobre o ex-governador eleito em conseqüência da tragédia que se abateu sobre seus correligionários.
Ferrer se refere a um comício realizado na Praça da Bandeira, onde morava e de onde guarda as melhores recordações. Neste comício - do qual tenho um registro fotográfico - ele cita uma discussão acerba ocorrida entre dois irmãos, um no palanque e outro na platéia, em apartes inesquecíveis. O esculacho mútuo, se de um lado provocou apreensão dos ilustres visitantes, de outro propiciou incontidas gargalhadas dos nativos, que, afinal, já conheciam aquela encenação patética. O que Ferrer abriu mão de dizer foi o nome de cada um dos manos briguentos, verdadeiro segredo de polichinelo: em Oeiras, todo mundo sabe que ambos se chamavam Chico e Cazé Sá. Aliás, as freqüentes desavenças era uma maneira do “sasismo” bem se relacionar.
Poderia relatar diversos episódios pitorescos envolvendo membros desta tradicional família oeirense, protagonizados, inclusive, pelo Dr. Pedro Amador Martins Sá, juiz de direito, de saudosa memória. Mas vou me ater a apenas dois fatos nesta página de memória.
Chico e Cazé Sá, falecidos, foram funcionários da Empresa dos Correios e Telégrafo - ECT. Aí pelo início dos anos 70 (setenta), semanalmente, baixava uma aeronave do Correio Aéreo Nacional - CAN. Certa feita, houve uma altercação entre ambos, que estavam de fogo, para saber quem iria naquele dia, uma sexta-feira, deixar o malote no Campo de Aviação. Com a ajuda do colega de trabalho, Oliveira Sinimbu, assentou-se que seria o Cazé quem iria desincumbir desta tarefa.
Pois bem. Cazé apoderou-se das correspondências, encomendas e outros trecos objetivando cumprir o que foi acordado. Antes, porém, foi ao Mercado Público ingerir umas tiungas. Lá pelas 11 (onze) horas, encontrando o primeiro cavalo que viu apeando em sua frente, neste montou-se. Somente no final da tarde, o proprietário do animal, um matuto que veio participar da feira citadina, sentiu falta do seu alazão. Cidade pequena, logo ficou sabendo da notícia de que Cazé Sá se fazia trafegar nesta alimária. Quando chegou no pátio de pouso, um pouco distante do centro urbano, viu o Cazé dormindo debaixo de uma frondosa árvore, o malote de lado e o eqüino amarrado num canto de uma cerca. O avião aterrissou, levantou vôo e nada a ser deixado ou recolhido!
Doutra feita, simplesmente o Cazé surtou de vez. Chico, muito solícito, dono de um jeep, e com o concurso do amigo Deoclides Amorim, aplicou um sossega leão no querido mano. Telegrafou para o Dr. Clidenor Freitas, médico, em Teresina, dizendo que estaria chegando no Hospital Meduna, em breve.
A estrada, ruim, era de chão batido. O poeirão encobria os viajores. Com muita peleja, chegaram ao destino planejado. Ainda grogue, Cazé dormia no fundo do carro. Chico, todo empoeirado - parecia o diabo em figura de gente - foi falar com a atendente que botou mil dificuldades. Enfim, não seria possível o início do tratamento psiquiátrico. Irreverente que o era, Chico Sá, ligou as caixas de som, e deu o maior espetáculo. Resultado: dois seguranças colocaram-no numa camisa de força. A confusão foi desfeita ante a presença do Deoclides apontando o verdadeiro paciente!
*Promotor de Justiça