
Os vÃcios de Elpidinho - II

*Por Gutemberg Rocha
Em crônica anterior, tratei de um dos vícios cultivados pelo comerciante Elpídio de Sá Cavalcante, conhecido popularmente em Oeiras como Elpidinho: o Trabalho. Agora, quero destacar outro vício que ele alimenta sem reservas e que o alimenta desde sempre: o Bom Humor. Hoje nonagenário, ele é daquele tipo de pessoa que “perde o amigo, mas não perde a piada”. Não há quem se encontre com ele e não ouça um gracejo, uma anedota, uma brincadeira. Se ele não fosse comerciante, creio que seria humorista.
Seu “escritório”, um cantinho reservado na entrada do Ponto Certo, com vista privilegiada para todo o ambiente, é repleto de cartazes, tirinhas de jornal, recortes de revista, com piadas e mensagens bem-humoradas. Em hipótese alguma lhe pode faltar a edição da quarta-feira do jornal Diário do Povo, de Teresina, onde é publicada a coluna Gangorra, que traz cultura, curiosidades, reflexões e, pra completar, as piadas de salão do quadro “Risolândia”.
Tudo o que acha interessante, desde frases da chamada “filosofia de para-choque” até textos clássicos da literatura universal, ele coleciona, reproduz e distribui, tentando transformar o mundo num lugar mais alegre e mais humano. Tempos atrás, mandou confeccionar e distribuiu, entre proprietários de carro, faixas adesivas com a seguinte recomendação: “Seja paciente no volante para não ser paciente no hospital”. Não sei não, mas depois que coloquei uma faixa dessas na traseira do meu automóvel, percebi uma redução drástica nas buzinas atrás de mim, no trânsito de Teresina. Coincidência? Acho que não!
Dizem que “se conselho fosse bom, ninguém dava, vendia”, mas com Elpidinho não é bem assim. Seus conselhos são bons e gratuitos. Quando Dunga era técnico da seleção brasileira de futebol, ele fez um cartaz em que aconselhava: “Faça como o Dunga: não use crack!” Infelizmente nem todo mundo segue os bons conselhos, e a droga anda a se espalhar pela cidade e pelo campo.
Elpidinho não perde oportunidade de dizer uma graça. Certa feita, presenciei um conhecido seu chegar para se despedir: “Seu Elpídio, estou indo pro Pará. Dizem que por lá está correndo muito dinheiro.” Ele, então, saiu com uma das suas: “Rapaz, aqui, que dinheiro não corre, a gente não pega, imagine lá!” Outro dia, por ocasião do falecimento de uma pessoa de sua estima, veio-me ele com esta: “Gutemberg, Estão acontecendo umas coisas muito estranhas aqui em Oeiras: gente que nunca morreu agora está morrendo! Meu amigo Fulano acaba de falecer. Como é que pode?!”
Ele caça conversa com cada freguês que entra no seu estabelecimento. Às mulheres, dirige elogios e galanteios; aos homens, troças e galhofas, e os desavisados (os avisados, também) saem às vezes constrangidos por ter “caído” nas suas “pegadinhas”. Nesse ritmo ele vai levando a vida. Viciado que é em bom humor, tem sempre uma piada pra contar. Piadas de português, papagaio, padre, político e polícia (para ficar apenas na letra pê) ele tem aos montes. De sogra, então, nem se fala. E por aí vai! A própria loja ele a utiliza como objeto das suas “tiradas”. As promoções, por exemplo, são ótimas. Um dia desses, dependurado em local bem visível, um cartaz anunciava: “PROMOÇÃO: Peça fiado e ganhe um NÃO inteiramente grátis!”
É por essas e outras que ele haverá de chegar ao centenário, com a Graça de Deus!
* Gutemberg Rocha é do Instituto Histórico de Oeiras