
Opinião: Caminheiro

* Por Carlos Rubem
Cabeceira foi quem espalhou a notícia. Narrava os prodígios operados por um velho que vinha a pé, das bandas do Pernambuco. Caminhoneiro tarimbado, asseverava que o ultrapassou no topo de uma ladeira e quando chegou embaixo, lá estava o homem misterioso. Pirralho, fiquei desconfiado...
Por onde passava, acorriam multidões. Aumentava a propalada fama. Boataram até que Dom Edilberto Dinkelborg e o governador Helvídio Nunes (que iam para Pio IX e São Julião, respectivamente) tinham ido ao encontro do novo Messias.
Exatamente, no dia 12 de janeiro de 1970, início do pôr-do-sol, debaixo de uma chuva fina e passageiro arco-íris, tal andarilho passou por Oeiras. Esquálido, barbudo, usava rota vestimenta e chinela japonesa. Calado! Caminhava sempre ao lado esquerdo da Central, hoje denominada Transamazônica (BR 230), cheia de buraco e visagem.
De preferência das mãos de crianças, apenas aceitava leite, que bebia após misturar um pó que trazia no bolso.
Parou um pouco na entrada da cidade. Recostou-se numa estaca de madeira. Nunca falava. Seu olhar denunciava profunda dor. Fez-se grande ajuntamento de curiosos. Necessária intervenção policial em face do atropelo criado. Todos queriam conhecer o esquisito visitante. E haja registro fotográfico!
Para logo, prosseguiu solitária viagem, se bem que muitos o acompanharam, até não sei onde. Adiante um pouco, sentou-se numa enorme pedra, que ficou “sagrada”. Colocaram uma cruz depois, acenderam velas e rezaram.
Esteve em Floriano. Dirigiu-se aos confins do sul do Estado. Assunto permanente das conversas. Para muitos seria sinal do fim do mundo. Depois do velho, aliás não era tão velho, viria a besta-fera, em forma de mulher. E veio, mas esta é outra história...
Em verdade, o povo impressionou-se. Explicações foram dadas sobre este fenômeno pelo Arcebispo de Teresina, Dom Avelar Brandão Vilela, no seu catequético programa diário “Oração por um dia feliz”, na Rádio Pioneira.
Desencontradas eram as versões sobre o excêntrico peregrino. Seria paulista, profissional competente, gente fina. Enlouquecido ao causar a morte de toda a família num desastre de carro por ele guiado, em Minas Gerais. Fugia sem destino... Comentou-se que, no Maranhão, teria seduzido uma manceba na casa onde recebera graciosa hospedagem. Disseram que havia morrido.
O certo é que seus passos continuam gritantes na memória de quem o conheceu em sua silente caminhada pela estrada da vida...
*Carlos Rubem é promotor de Justiça