
Crônica ao vento

Por Rogério Newton
Lembro-me do tempo em que foi criado o Parque de Lazer. Era um lugar bom, cheio de árvores, com espaços para se caminhar e correr e um pequeno campo de futebol. Foi uma iniciativa lúcida. Obra simples e benéfica. A principal atração era a natureza. Fui lá vezes sem conta, para jogar e curtir. Muitas pessoas o visitavam. Professoras acompanhavam alunos em atividades fora da sala de aula. Logo após sua criação, recebeu o nome Paulinho Menezes, que gostava muito do Café Oeiras e perdeu a vida num acidente em Recife. Outro dia, tentei visitar o parque. Estava fechado. Diferente, machucado, com ares de abandono.
Agora, depois de vinte e poucos anos, leio em um portal que vão construir um hotel dentro dele. Me espantei, pois ainda sou assim, e, de cara, veio a pergunta: por que um hotel particular na única área verde pública da cidade? Se é que existe, deixo a resposta a cargo do leitor. Apresso-me, entretanto, em dizer que não pretendo modificar o modo de ver e de pensar de ninguém. Os únicos pontos de vista que desejo mudar são os meus, e não consigo.
Não me furto, porém, a entrar na notícia. Diz o texto: “o terreno já começa a ser limpo”. Fiquei me perguntando o que exatamente isso quer dizer. Pensei logo em algo malcheiroso. Detritos. Mas não. Ao ver as fotos que ilustram a matéria, acho que decifrei o significado da expressão. As imagens mostram um trator e um caminhão carregando pedaços de árvores.
Em outra parte, a notícia afirma que “serão feitas entradas independentes para o hotel e o Parque de Lazer em si”, delimitando público e privado. Pergunto qual vai ser a área do parque: a melhor ou a pior, a maior ou a menor? Mas deixo também essa pergunta para o leitor.
Uma pessoa, que leu a notícia comigo, disse: “Mas o parque estava ocioso”. Não contesto. Ociosas são também todas as florestas, que nada fazem, a não ser fornecer oxigênio e outras benevolências para o planeta e a humanidade. Segundo Thoreau, se um homem gasta a maior parte do seu dia a ficar perto de árvores, por gostar delas, será considerado desocupado, mas se derrubá-las será festejado como um homem de ação.
Seja como for, desejo sucesso para o empreendimento. O Parque de Lazer não pode atrapalhar o progresso da cidade, que precisa de um hotel à altura dos seus trezentos anos de solidão.
Falo essas coisas só por apreciar um tantinho as árvores e o seu entorno. Talvez esteja lendo demais o poeta Manuel de Barros. Isso só agrava minha situação. Em melhor condição estão as árvores. Não tecem nem fiam. Nem escrevem, como eu, crônicas ao vento.